Cassação de Selma Arruda é patifaria contra a Lava Jato

*Por Antero Paes de Barros

A juíza aposentada Selma Arruda que se candidatou e venceu a eleição para o Senado da República, indiscutivelmente cometeu erros jurídicos que podem levar a cassação do seu mandato. É legítima a decisão do TRE de Mato Grosso que, por unanimidade resolveu cassar o mandato em função de gastos fora do período permitido na campanha eleitoral e, como esses gastos não foram declarados carimbou-se de caixa dois. Então, os crimes eleitorais foram dois; o caixa dois e o abuso de poder econômico cometido na campanha eleitoral. E isso, pela lei eleitoral obriga a cassação do mandato.

Vamos entender como os fatos se passaram. Selma deixa a magistratura e resolve se candidatar ao Senado. Contrata uma empresa de marketing, a Genius Publicidade, fora do período eleitoral, na chamada pré campanha. Faz alguns pagamentos e deixa de fazer outros. Por causa disso, a empresa move ação de cobrança, os fatos tornem-se públicos e os seus adversários propõe a cassação do mandato, respaldados pelo Ministério Público Eleitoral. Mais tarde, na apresentação das contas ela não relata esses fatos, o que leva o Tribunal a entender que então é caixa dois. Tudo muito simples.

Em defesa da Selma pode-se argumentar o seguinte: Caixa dois não é e nunca foi. A própria justiça constatou que os pagamentos foram feitos por cheques emitidos pela senadora e cujo dinheiro havia sido depositado em sua conta pelo seu suplente. O que caracteriza caixa dois é quando se procura esconder quem é o doador, com recebimento de dinheiro oculto, por fora, sem revelar quem doou. Não foi nada disso que aconteceu, mas ficou carimbado como caixa dois. Mesmo sem ser. Questão de interpretação.

A outra acusação é que ela teria praticado abuso de poder econômico, por ter gasto dinheiro pessoal, em período onde esse gasto não era autorizado, a não ser que fosse realizado pelo partido.

Deu pra entender a diferença? Se o mesmo dinheiro, ou quantia até superior tivesse sido gasto pelo partido, não haveria o abuso de poder econômico. Não há o que contestar quanto aos outros candidatos, pois se despesas realizaram nesse período foi pelo partido e não por contas pessoais.

Isso está na lei, daí a possibilidade de interpretar com a perda do mandato. Não deixou de ser um erro, até primário, cometido por uma ex-juíza, que deveria ter tido mais zelo, ao organizar os gastos de sua campanha. Mas quem vive em Mato Grosso sabe que não houve também, na campanha da juíza Selma, abuso de poder econômico. Selma venceu porque teve muitos mais votos que seus adversários e não por causa desses recursos gastos na pré campanha. Essa, a verdade real.

Se formos verificar os gastos de outros candidatos, que ganharam ou foram derrotados dá pra perceber que eles gastaram mais, bem mais do que a juíza Selma. Não preciso recorrer ao que está declarado no TRE, basta comparar os volumes de campanha da Selma vencedora, com Fávaro, o terceiro colocado. Indiscutivelmente, Fávaro gastou mais, embora de forma mais organizada.

Para concluir existe a questão da soberania do voto. Cassar um mandato popular em cima de duas meias verdades é demais. Os recentes acontecimentos no Senado mostram que a guilhotina está afiada e a pressão é célere para concluir o julgamento. O processo da Selma demoraria bem mais tempo, mas neste momento, as forças vivas da República se uniram para apressar a cassação dela, pois é muito importante que o requerimento de CPI da Toga tenha uma assinatura a menos e com isso, o poder judiciário não possa ser passado a limpo.

Selma não está sendo cassada nessa velocidade toda por causa das falhas infantis cometidas em Mato Grosso.

Está sendo cassada porque não aceitou a proposta da absolvição em troca de tirar o seu nome da lista da CPI da Toga.

Está sendo cassada porque resistiu a pressão do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, que quer evitar a CPI para retribuir o absurdo que fez por ele, o presidente do STF, Dias Toffoli.

Está sendo cassada por causa do pacto não republicano celebrado entre os líderes dos poderes, que deixaram de ser independentes entre si, para estarem unidos na defesa da impunidade. E Selma ousou não concordar com isso.

O que o Brasil testemunhou na quarta-feira (11), da Procuradora Geral da República é uma indignidade jamais vista na instituição. A Drª Raquel Dodge recebeu o pedido de manifestação do TSE na última quarta-feira e pasmem, no mesmo dia, sete horas depois encaminhou seu parecer de 75 laudas ao TSE opinando pela cassação do mandato de Selma e novas eleições para o Senado em Mato Grosso. Raquel Dodge nunca foi tão ágil na vida, em nenhum processo.

Isso tudo tem um só nome: patifaria contra a Lava Jato e a favor da impunidade.

Soube na última quarta feira, que na próxima semana, a senadora vai se filiar ao Podemos que já é a segunda maior bancada do Senado. Creio que está na hora do partido de Álvaro Dias e do deputado Medeiros exigirem da mesa do Senado, que ainda que ocorra essa decisão no TSE, ela não seja cumprida, o que tem amparo inclusive em recente decisão do STF, que permite às casas legislativas revogar decisões da justiça em defesa de seus membros.

Neste momento o mais importante em Mato Grosso é defender o mandato da Selma e com isso permitir uma voz a mais lutando pelo fim da impunidade no Brasil.

*Antero Paes de Barros é jornalista e ex-senador da República (pnbonline.com.br)

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