Prisão em massa de promotores: como assim, doutor Tiago?

“Não é de se duvidar. Nos tempos de absoluta inversão ou de subversão do regramento legal, prender os combatentes da alta delinquência e premiar consagrados bandidos com a impunidade não seria nada estranho”


*Por Edésio Adorno

O artigo 40, inciso IV, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei n.º 8.625/93), assegura como prerrogativa do Membro do Ministério Público “ser processado e julgado originariamente pelo Tribunal de Justiça de seu Estado”.

O Correio Braziliense revela que o presidente da Associação Mato-grossense de Magistrados (Amam), Tiago Abreu, em conversa de Whatsapp com um juiz de Brasília, teria dito que pode ocorrer prisão de membros do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) no bojo da Grampolândia Pantaneira.

De acordo com a mensagem atribuída ao togado, “seria a primeira prisão em massa de promotores de justiça do país”. Não é de se duvidar. Nos tempos de absoluta inversão ou de subversão do regramento legal, prender os combatentes da alta delinquência e premiar consagrados bandidos com a impunidade não seria nada estranho.

Para afirmar com o mínimo de segurança ou de responsabilidade que promotores de justiça serão presos ‘no atacado’, o dirigente da AMAM deve falar com base em informações de alcova recebidas de algum desembargador do Tribunal de Justiça. E é aí que a porca torce o rabo.

Abreu é servidor público. Revelar informação que deveria ser mantida em sigilo, frustrar operação policial, antecipar eventual e herpético decreto de prisão cautelar pode configurar grave falha funcional. A quebra do dever de segredo ou de sigilo funcional resta evidente.

Tiago teria dito ainda a esse juiz de Brasília que uma “organização criminosa se instalou no órgão do Ministério Público estadual”. É uma acusação extremamente grave, que exige do presidente da AMAM mais que esclarecimento. Ele precisa fornecer provas irrefutáveis quanto a alegada transmutação do Gaeco em organização mafiosa. É urgente a indicação de nomes, de materialidade de crimes e provas de autoria. Não é crível que os membros do Gaeco/MPE chafurdaram na pocilga e se enlamearam com os porcos da corrupção e da criminalidade graúda.

O dirigente da AMAM, segundo a reportagem do CB, formou sua convicção quanto aos ilícitos praticados por promotores de justiça com base em depoimentos de réus confessos de participação no esquema de interceptação telefônica ilegal. “Está mais do que comprovado com os depoimentos que já foram colhidos, que foi utilizado o aparato institucional para fazer perseguição política”. Desde quando mero depoimento de réu, dissociado de outros elementos de provas, é o suficiente para formar tamanha convicção exauriente?

Na mensagem, via telefone, Tiago Abreu faz uma avaliação política do imbróglio jocosamente denominado Grampolândia Pantaneira. “Isso aqui está bem próximo de ser descortinado e a gente ter a primeira prisão em massa de promotores de justiça”.

O bravo sindicalista quer mais.

Tiago considera a eventual prisão em massa de membros do Gaeco “uma forma de a gente dar uma lição para o nosso país”. De fato, desmoralizar o Gaeco, fragilizar o MPE, intimidar promotores e procuradores de justiça é uma bela lição, com a qual organizações criminosas comungam sem ressalva. Investigações em curso serão obstaculizadas, condenações podem ser anuladas e bandidos afamados vão poder retornar do ostracismo para o desfrute impune do dinheiro roubado do povo de Mato Grosso.

Ah, Edésio, você está defendo que promotores eventualmente envolvidos na Grampolândia sejam premiados com a impunidade? Claro que não! Que investigue tudo e puna quem deva ser punido, conforme determina o script legal. Devido processo legal, ampla defesa, contraditório e coisas do gênero. O que se questiona, aqui, é fala de um juiz investido em um cargo de representação da classe. Tiago Abreu já negou ter dito o que o Correio Braziliense afirma que ele disse.

Para espancar qualquer dúvida e comprovar que de fato não fez os comentários indevidos, desairosos e levianos sobre o MPE, conforme noticiou a imprensa, o presidente da AMAM não tem outra escapatória. Deve interpelar o CB e processar o repórter Humberto Rezende, que assina a matéria. É o mínimo que a sociedade espera.

*Edésio Adorno é advogado em MT – E-mail: edesioadorno@gmail.com​

Governo no ar

Deixe uma resposta